terça-feira, 29 de junho de 2010

Muros visíveis e invisíveis

Desde tempos passados, passando pela crise da “casa grande e senzala” até a contemporaneidade, a sociedade brasileira é marcada pelas desigualdades sociais que são fortalecidas por raízes cada vez mais fincadas em território que propicia as desigualdades na medida em que são envoltas em um sistema socioeconômico e cultural no qual os mais poderosos lutam para se manterem na cúspide da pirâmide social, enquanto os menos favorecidos lutam pela sobrevivência sem qualquer força de discussão. Essa realidade possui fortes pilares com base histórica. Com toda essa desigualdade social, o Brasil é uma nação que se afirma democrática de direito, mas que não consegue romper com os laços coloniais da desigualdade, seja por impossibilidade ou mesmo por falta de interesse. São inúmeros os elementos em jogo: interesse – como já enunciado -, vontade, a própria história de constituição da nação brasileira, que, inevitavelmente, já corrompe – direta ou indiretamente - as futuras formações das pessoas.

A desigualdade social que hoje é sentida, já foi percebida anteriormente, perdurando, assim, através dos tempos e, talvez, seja por esse motivo que esse contexto desigual esteja tão impregnado na sociedade. Existe um longo histórico que fortalece a estrutura da sociedade. O próprio regime socioeconômico e cultural difundido pelo mundo massifica a desigualdade e, de certo modo, dá gênese para que existam indivíduos com poder aquisitivo cada vez maior e outros que buscam incansavelmente alcançar esse ápice. É um sistema que impõe essa atividade de fomentação pelas riquezas entre os indivíduos. Gente cada vez mais rica e gente que quer também toda essa riqueza. É um ciclo da desigualdade e do individualismo, pois, não há espaço para todos. Cada um tem que buscar o que é seu independe de quem é o seu próximo. Não se fala em dividir riquezas; em distribuição dos maiores com os menores. O que se quer é o mais e mais para si, e só para si.

Nesse contexto é que se constroem os muros que dividem as pessoas. Se não são todos iguais, colocam-se muros e tudo se estará resolvido. São muros altos, fortes e que crescem a todo o momento, assegurando, assim, a proteção por conta da vizinhança inóspita e hostil. Esses muros são erguidos como explicação para a violência que os atingem, mas na verdade existem outros pontos que também estão em questão. Muros da segregação, assim por dizer.

Não é nenhuma novidade o fato de que os mais afortunados não querem se misturar com a plebe. A história do Brasil é marcada por isso. Assim como diferentes credos e ideologias não querem. Intolerância perante o desigual faz parte da cultura brasileira e é assim que os muros, visíveis ou invisíveis, surgem como aparato eficaz para problemas desse gênero.

A apartheid que durante anos se mostrou presente e extremamente perceptível no continente africano não é característica única deste espaço territorial. Os muros da desigualdade construídos no Brasil são uma prova de que a apartheid está aqui. São muros que se constroem com a segregação entre as diversidades e nutrem-se com a intolerância e o preconceito. Esses muros não precisam estar visíveis aos olhos – como os vidros blindados, por exemplo -, pois se constituem de uma forma superior que vai além do material e do que pode ser visto. Muros que existem pelo concreto e além deste.

Diante dessa realidade nada se tem feito para que os muros sejam extintos. Com relação ao aspecto socioeconômico, o desemprego, a falta de oportunidade de estudos – que são fatores cada vez mais constantes – fazem crescer os muros. Enquanto a população mais pobre enche as favelas já bem lotadas, os mais ricos procuram morar nos luxuosos condomínios que crescem ao lado dos morros num completo disparate. E o que os separam? Muros. Não há como negar que a apartheid social existe. Quanto aos credos e às ideologias o mesmo acontece: segregação.

A economia mundial que prega o capitalismo voraz trás consigo conseqüências de grande intensidade à medida que exclui toda e qualquer forma de socialização da economia entre os cidadãos. Essa individualização dos bens contribui preponderantemente na construção dos muros. O problema que existe não é da falta de estrutura, mas sim de uma superestrutura na medida em que o que se questiona é a individualização que tem havido na sociedade. As pessoas querem ficar tão ricas quanto aquelas que já são e não pensam em dividir suas oportunidades com outras. O lema é: cada um por si e ponto.

Cada muro – visível ou não – que é construído está impregnado de elementos que completam o conjunto da desigualdade social. A história já contribui enormemente na essência e ao seu lado os pré-conceitos, a intolerância, a falta de interesse de querer o melhor não só por si, mas para todos, constituem os pilares que fortalecem o quadro da desigualdade. É preciso haver uma nova postura de todos os indivíduos para que ocorram mudanças de fato na sociedade; para que sejam derrubados esses muros que fomentam a caracterização da apartheid.

Um comentário:

  1. Muito bom o texto. Precisamos de pessoas assim como você que represente o pensamento crítico de forma livre, simples e objetiva.
    Grande abraço, Aline.

    ResponderExcluir